Análise
A Vida, Acima de Tudo (Life, Above All) é um registro duro de uma tragédia africana. Em sua adaptação do romance Chanda’s Secrets, de Allan Stratton (1971), o diretor sul-africano Oliver Schmitz (1960) nos leva a uma favela de Joanesburgo e à vida de uma família monoparental cuja filha mais nova acaba de morrer em circunstâncias incertas: a palavra oficial é gripe, mas a fofoca da aldeia sugere algo mais além.
A protagonista, a adolescente Chanda (Khomotso Manyaka) vai a uma funerária próxima para ver caixões em escala infantil. Havia vários e claramente, a morte desta criança não é um evento isolado, mas o verdadeiro problema segue quando Chanda retorna ao casa que ela divide com sua mãe doente e seus dois irmãos mais novos, e descobre que alguém fugiu com o dinheiro que ela reservou para enterrar sua irmã.
“Não é nada“, insiste a mãe da heroína, referindo-se à lesão que cresce em sua perna, e o filme trata com mais força sobre uma cultura particular de negação: o impacto de uma doença cujo nome não se pode pronunciar. A narrativa nos apresenta uma geração inteira que foi negada a infância, a educação e a vida a que têm direito, tendo que cuidar de pais cada vez mais fracos e vulneráveis.(Apenas Chanda fala da AIDS diretamente; outros na comunidade preferem o eufemístico, “a ira de Deus”)
O filme não se torna enfadonho, devido à maneira como Schmitz o enraíza nos personagens. Há a robusta vizinha dona Tafa (Harriet Manamela), que – com os olhos postos na respeitabilidade social e na manutenção da aparência do bairro – arrasta consigo a mãe de Chanda a curandeiros e à igreja, numa busca insistente. Há o amante da mãe (Patrick Shai), abdicando de toda a responsabilidade pela morte da criança, que aparece na porta da família sempre que precisa de uma transa fácil e os rouba às cegas pelo privilégio. Há a empobrecida melhor amiga de Chanda, Esther (Keaobaka Makanyane), que – de forma dolorosa – anda de bicicleta até a parada de caminhões para se prostituir.
E há a própria Chanda, lindamente encarnada por Manyaka, que é dura, corajosa e inteligente, e ainda assim alguém por quem você fica com medo de que seja arrastada para baixo por essas circunstâncias. Se o progresso de seu protagonista nunca é fácil, a direção de Schmitz pelo menos encontra o equilíbrio certo para o filme se estabeleça entre o desespero e o otimismo, como na cena que uma música pop toca em um som de carro, numa primeira dança no quintal de um vizinho dando pequenos sinais de encorajamento e evitando que tudo se torne um pouco demais. O coração do filme é tão grande quanto o Serengeti, e sua empatia e compaixão são igualmente ilimitadas.
Homenagem Póstuma: Patrick Shai (1956-2022)
O ator e diretor Patrick Shai morreu no dia 22 de janeiro. Ele era mais conhecido pelos papéis nas séries de televisão como Soul City , Generations, Zone 14, Ashes to Ashes e Zero Tolerance. Ele foi um dos membros fundadores da Free Film Makers of South Africa. Shai era casado com Mmasechaba Shai e juntos tiveram dois filhos. Ele cometeu suicídio em Dobsonville em 22 de janeiro de 2022.
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